Declaração de IR é nova etapa para quem aderiu à anistia

Publicado em 24/4/2017

Os contribuintes que aderiram à anistia aos recursos omitidos no exterior até outubro passado agora têm a missão de trazer para a declaração de ajuste anual de 2017, ano-calendário 2016, essas informações com a devida coerência. O prazo termina na sexta-feira, dia 28. E, mais do que isso: a partir do momento em que abriu para a Receita Federal os bens e direitos que possui fora do Brasil, a pessoa física passa a ter a responsabilidade de pagar tributos sobre ganhos de capital ou rendimentos que tenha obtido com venda de ações, imóveis, receitas de aluguéis, dividendos, ou juros intermediários em títulos de dívida, mesmo que o crédito tenha sido feito numa conta bancária domiciliada no exterior.

Quem fez a regularização cambial e tributária de ativos na primeira etapa do programa no ano passado já teve que, em abril último, reportar os valores que detinha lá fora ao Banco Central no censo de capitais brasileiros no exterior (CEB). Só que as informações prestadas à autoridade supervisora são feitas pelo valor de mercado e houve muita dúvida se essa mesma prática teria que ser replicada na declaração de ajuste anual, diz Alessandro Fonseca, sócio do escritório Mattos Filho, especializado em gestão de patrimônio. "Isso não se reflete. Na declaração de Imposto de Renda, o valor histórico, o custo de aquisição, é o mais importante."

Segundo o especialista, após a regularização feita no ano passado com base na data de corte de 31 de dezembro de 2014 ao câmbio de R$ 2,66 - com as respectivas retificações nas declarações anuais de 2014 e 2015 como previa a lei de anistia -, é relativamente simples transportar essas informações para o informe referente a 2016. No caso do contribuinte que tem uma pessoa jurídica constituída fora do Brasil, estrutura em que agrega seus bens e direitos, é só repetir os dados presentes na Declaração de Regularização Cambial e Tributária (Decart). Para as aplicações financeiras na pessoa física, cabe uma atualização dos saldos da mesma forma que o investidor faz hoje com as contas no Brasil.

"Se o contribuinte se descuidar, ele volta para o plano anterior [de ausência de declaração]", diz Fonseca. "Tem que manter os ativos declarados, tanto para o Banco Central (BC) quanto para a Receita Federal, e declarar corretamente."

“Esta será a primeira vez que muitos brasileiros vão apresentar suas declarações completas, de maneira corriqueira, incluindo os bens locais e os que até aqui não eram informados no exterior. Então toda a cautela é necessária”, adverte o professor do mestrado em Ciências Contábeis da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP) Tiago Nascimento.

Depois de atender a uma série de exigências fiscais, o investidor tem que estar ciente de que agora está mais exposto à fiscalização. "Antes a Receita Federal não tinha essas informações, agora vai poder auditá-las." Ele diz que se porventura alguém declarou apenas uma conta porque não tinha o dinheiro para pagar a multa e o imposto relativo às demais posições, pode estar mais vulnerável. E a fiscalização pode retroagir a cinco anos. "Tudo que eu faço hoje pode ser fiscalizado daqui a cinco anos com sistemas e controles que ainda não existem e normas tributárias que nem imagino."

A regularização de ativos não declarados no exterior, prevista na Lei 13.254, trouxe para a legalidade mais de 25 mil pessoas físicas, universo que se soma a outros 36 mil contribuintes com mais de R$ 100 mil que mantinham em bens e direitos fora do Brasil, segundo o último censo de capitais estrangeiros do BC, de 2015. Mas conforme lembra o advogado Roberto Justo, sócio do escritório Choaib, Paiva e Justo Advogados, as obrigações não terminam aí.

Diferentemente dos bancos brasileiros, que enviam para a Receita Federal informações sobre a apropriação do imposto referente a aplicações financeiras em fundos de investimentos, títulos de emissão bancária, do Tesouro ou papéis de dívida, isso não ocorre com as contas estrangeiras. "O contribuinte tem que pagar imposto sobre todo o rendimento e ganho de capital que auferir, mesmo sem trazer o dinheiro para o país. O Brasil tributa todos os rendimentos, em qualquer lugar do mundo", afirma Justo.

Se nunca declarar os rendimentos ou ganhos de capitais auferidos fora do Brasil mesmo o contribuinte que tenha aderido à anistia pode cair na situação anterior, diz Pedro Barreto, executivo-chefe da Ativore Global Investments, uma assessoria global de investimentos em imóveis para renda. "Como no exterior o banco não informa, a gente tem que voluntariamente oferecer o dinheiro ao Fisco, vai chorando, mas tem que fazer porque senão volta a ter patrimônio irregular e será passível de processo criminal por evasão de divisas e ocultação de patrimônio."

Conforme explica Fonseca, do Mattos Filho, a venda de ativos fora do Brasil cai na regra geral de ganhos de capital, cuja alíquota de tributação estava fixada em 15% até 31 de dezembro de 2016. Neste ano passou a valer, porém, uma nova tabela progressiva que taxa em 15% a parcela dos ganhos que não ultrapassar R$ 5 milhões; subindo a 17,5% para aquela que ficar na faixa entre R$ 5 milhões e R$ 10 milhões; 20% para valores entre R$ 10 milhões e R$ 30 milhões; e até 22,5% sobre ganhos que superarem os R$ 30 milhões. Agora se o acréscimo no patrimônio advém de cupom de juros ou renda com aluguéis, a tributação é de 27,5%.

Quem vendeu algum bem lá fora no ano passado e aderiu ao programa de regularização de ativos pôde pagar o imposto devido até dezembro sem incidência de multa. Mas quem não usou essa janela tem que fazer isso agora, trazendo essa operação desde a ocorrência até abril, pagando multa de 20%.

Barreto, da Ativore, recomenda manter um controle sobre o fluxo do dinheiro entre o Brasil e o exterior, guardar todos os contratos de câmbio, para o caso de sofrer alguma autuação da Receita conseguir comprovar a origem do dinheiro.

Já com a segunda fase do programa de anistia em vigor, há contribuintes aproveitando para fazer a regularização dos ativos e a declaração anual do imposto de renda concomitantemente, diz o tributarista Nelson Lacerda, do Lacerda & Lacerda Advogados. "Isto é ótimo, porque não precisa retificar a declaração de IR, depois de fazer o Dercat." O especialista lembra que esta é a segunda chance de regularizar e o prazo de 120 dias já está correndo.

O expatriado, por sua vez, quando vai para o exterior precisa fazer o comunicado de saída para a Receita e passa a não declarar IR. No intervalo que estiver fora do país, ao obter ganhos de capital no Brasil é tributado como não residente, diz Justo. Se vender algum bem, a alíquota de imposto é de 15% caso esteja morando fora de paraísos fiscais, mas se for em alguma jurisdição com tributação privilegiada, a taxação sobe para 25%.

Fonte: Valor Econômico – Adriana Cotias.